beijo livre grupo 1979
Foto do arquivo de Romário Schettino, que, na foto, lê documento de fundação do Beijo Livre

Em duas ocasiões no Brasília Orgulho deste ano, cujo tema foi Stonewall 50 Beijo Livre 40 – Resistência e Conquistas, tivemos o privilégio de contar com a leitura da carta de um dos fundadores do coletivo brasiliense pioneiro do ativismo arco-íris.

O jornalista Romário Schettino fez texto especialmente para a lembrança que fizemos dos 40 anos de fundação do primeiro grupo gay ativista da capital federal, criado em 1979. A primeira leitura foi realizada no hasteamento da bandeira arco-íris em frente o Bar Beirute (109 Sul), na quarta 10 de julho (foto acima). A segunda, foi na 22ª Parada do Orgulho LGBTS de Brasília, no domingo 14.

Trata-se de um documento histórico! E aqui o temos na íntegra! Lembremos do passado, sintamos orgulho no presente, criemos força para o futuro!

40 anos de Beijo Livre

Quando vejo hoje jovens, homens e mulheres, senhores e senhoras, andando de mãos dadas, se abraçando e se beijando em público me lembro de nossas primeiras reuniões do Grupo Beijo Livre, em plena Ditadura Militar. Era 1979 e um grupo de gays “entendidos” (era assim que se chamava quem era gay assumido naquela época) resolveu discutir políticas de inclusão (nem sabíamos que o nome seria esse) e levantar a bandeira da liberdade sexual. E, mais do que isso, ir atrás do afeto e da união das pessoas em torno de um objetivo: a felicidade.

Naquele tempo, éramos poucos. Reuníamos em uma sala pequena, emprestada pela coordenadora do SESC, a Maria Duarte, para ler as cartas que chegavam ao Beijo Livre via Caixa Postal e preparar ações que pudessem repercutir de alguma forma na sociedade brasiliense. Participamos dos primeiros encontros nacionais em São Paulo. Fizemos o primeiro beijaço no Bar Beirute porque dois de nossos membros (que palavra!) tinham sido expulsos do bar porque estavam se beijando na semana anterior. Escrevemos uma carta ao Papa João Paulo II exigindo respeito aos homossexuais e, sobretudo, acolhemos as angústias dos gays que não tinham com quem conversar.

O Beijo Livre produziu o jornal “Manga Preta”, para expor as ideias do grupo, que era panfletado nas boates gays e em bares da cidade. O BL produzia shows na Boate Aquarius (SDS-Conic), peças de teatro e criou a Bunda do Delírio, uma ala desorganizada do Pacotão.

Nesses encontros houve até um casamento, escondido, claro. Ninguém ousava colocar seu nome publicamente, mas foi um avanço importantíssimo. Comemoramos esse casamento até hoje.

Além de mim e do Alexandre Ribondi, que fazíamos um par pioneiro e desbravador, com quem vivi 15 anos de minha vida, tinha o Fernando Souza, que hoje é casado e mora em Londres com um gay inglês, Marcos Bagno, hoje linguista de renome nacional, Plínio Mósca, Toninho de Souza, fotógrafo; o ator e diretor Humberto Pedrancini, o produtor Cleber Loureiro etc. As mulheres vinham e saíam.

Por tudo isso, pela história vivida e pelo prazer de tê-la compartilhado tantos amigos, hoje é dia de dizer a plenos pulmões: Viva o Beijo Livre! Que continue livre, apesar das tentativas de retrocesso que querem nos impor!

Romário Schettino

*Na foto: o coordenador geral do Brasília Orgulho, Michel Platini, o dramaturgo e jornalista Alexandre Ribondi – um dos fundadores do Beijo Livre – e o filho do dono do Bar Beirute. A foto registra o hasteamento da bandeira arco-íris promovida pelo Brasília Orgulho no Bar Beirute como forma de lembrar os 40 anos de fundação do Beijo Livre.